A arte de ser feliz
Houve um tempo em que minha janela se abriasobre uma cidade que parecia ser feita de giz.
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.
Era uma época de estiagem, de terra esfarelada,
e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde,
e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.
E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor.
Outras vezes encontro nuvens espessas.
Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro.
Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais.
Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar.
Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.
Ás vezes, um galo canta.
Às vezes, um avião passa.
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros,
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.
Cecília Meireles
Ops, olha eu atrasada, blogagem dia 07/11 e eu postando dia 08/11, desculpa Leonor, ando com problemas em relação a minha conexão de banda larga, não consegui acessar ontem... mas enfim, todo dia é dia de Cecília, uma das minhas autoras favoritas.
2 comentários:
Seu blog é um show de cultura. De longe é dos melhores da internet. Parabéns!
Querida Luciana,
Por favor, não se desculpe.
Fiquei muito feliz com a sua participação nessa blogagem coletiva.
Foi muito bom conhecer você e o seu blog.
A crônica que você escolheu é uma das minhas favoritas.
“Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela,
uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente,
que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.”
Cecília destaca que É PRECISO APRENDER A OLHAR …
Quer coisa mais rica do que essa? A arte de ser feliz necessita de uma certa maneira de olhar o mundo …
Cecília me faz lembrar Alberto Caeiro. Caeiro também destaca a importância do olhar …
“Não basta abrir a janela
para ver os campos e o rio
não é bastante não ser cego
para ver as árvores e as flores.”
Vamos continuar nos vendo.Visitarei seu blog outras vezes.
Um grrraannnnde abraço para você !
Com carinho,
Leonor Cordeiro
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